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terça-feira, 5 de abril de 2011

Na F1 tem-se sempre menos tempo de reação e mais tarefas dentro do cockpit

“Estamos cada vez mais ocupados com os botões em nossos volantes e temos cada vez menos tempo de olhar o que acontece ao nosso redor, quando estamos a 300 km/h. Isso pode trazer problemas de segurança” - Sebastian Vettel
A pessoas que têm a minha idade, viveram num período de transformações tecnológicas intensas. Basta tomar como exemplo a telefonia. Quando criança me lembro de ter usado um desses telefones de magneto nos quais voce girava uma manivela. Hoje carrego um celular no bolso. Há um autêntico abismo tecnológico entre uma coisa e outra.

Hoje mesmo fui levar uma cafeteria elétrica no conserto. Liguei a coitada no 220 e lá se foi. Toda de plástico, a única coisa metálica é uma cinta no jarro. E eu que sou da área de design industrial, trabalhando hoje em uma empresa de tecnologia, sei o que está por trás dessa cafeteira em relação à tecnologia de construção.

Não há como evitar um mundo todo tecnológico como o de hoje. O máximo que voce vai poder fazer é não utilizar determinadas tecnologias no seus momentos de ócio. Mas do que isso é impossível.

A F1 segue o mesmo caminho. Basta ver fotos de carros da década de 1960 e comparar com os atuais. A eletrônica está presente em tudo nesses carros, de cabo a rabo. O carro da Virgin por exemplo, é um legítimo nerd de alta performance. Embora esteja andando no final do grid tem o diferencial de ter sido totalmente concebido em computadores, sem o auxílio dos túneis de vento, que atestam na prática a performance da aerodinâmica.

Até aí eu entendo que se trata de evolução de engenharia. Mas quando isso chega ao ponto de dificultar a vida dos pilôtos, alguma coisa deve ser repensada nesse sentido. Pilôtos são pagos para pilotar os seus carros, de preferência ganhando as corridas. Para isso é preciso um carro melhor que o dos outros. Sempre o carro vencedor é aquele que está mostrando o melhor desempenho em relação aos demais.

E hoje na F1 as diferenças entre os carros estão mais no ambito da distancia física do que temporal. Antigamente aconteciam corridas em que alguns carros tomavam até 4 voltas do líder. Hoje, com exceção de equipes com performances no nível da Hispania, as outras se encontram a décimos de segundo por volta do ponteiro.

Na última corrrida apenas 7 terminaram na mesma volta do ponteiro depois de 1:30 de prova. Mas muito disso se deve às novidades às quais tôdos estão se ambientando, incluindo o desgaste dos pneus. Não é errado imaginar que daqui até o final da temporada haja uma aproximação maior entre a turma do fundão e os da frente.

Quero dizer que o desequilíbrio atualmente é bem menor que no passado. Mas há razões de sobra para isso. As pistas de hoje têm uma extensão que está na maioria dos casos entre 5000 e 5500 metros. Há exceções como Spa e Mônaco.

Uma parte delas é inteiramente nova, projetadas conforme parametros atuais, e as outras foram modificadas. Interlagos é um belo exemplo de pista alterada para um traçado sem curvas de velocidade muito alta. Tornou-se um circuito travado. No entanto os carros de F1 têm um desempenho muito bom nesse circuito quando comparamos a outros do calendário, levando-se em consideração as médias horárias.

Pelas regras vigentes um cambio deve durar 5 provas consecutivas. Antigamente havia casos de câmbios que eram trocados no warmup antes da corrida. Para se conseguir isso com o eixo primário do câmbio girando voltas e mais voltas a mais de 15000 rpm, é preciso muita tecnologia em todos os sentidos. Inclua-se aí a tecnologia relacionada com a operação em pista própriamente. Assim, surge aqui uma justificativa para voce ter ajustes online no volante, coisa que antigamente era desnecessária pois voce saía do box com o mesmo equipamento que terminava a corrida caso nao quebrasse. Lembram do Ayrton em Interlagos que no final da corrida andou a pista tôda em sexta?

Já que no câmbio voce não pode mexer, os ajustes finos precisam vir para fora. E a tecnologia eletronica permite isso. Isso também implica em motores que possam ser ajustados de forma mais dinâmica. E aqui há também a questão da durabilidade onde a eletronica faz a sua parte. A sincronia entre câmbio e motor não depende mais da sensibilidade do pilôto já que este não muda marchas e sim sinaliza a mudança que é feita por atuadores controlados eletronicamente.

Isso tudo quer dizer que essa botoeira toda dos volantes tem a finalidade de ajustar o carro às condições momentaneas. E se as pistas dão performance similar, isso passa a fazer sentido. O que não faz sentido na minha forma de avaliar essas coisas é que no passado os pilôtos estavam o tempo tôdo concentrados na atitude de pilotagem e o manuseio de mínimos comandos. Pilotavam durante tôda a corrida um equipamento que não variava. E agora são êles próprios que provocam essas variações durante a prova.

Não bastasse esse monte de botões grudados uns nos outros, agora devem acionar um flap na asa traseira que se espera que inevitávelmente volte à sua posição de repouso quando pisarem no freio. E ainda há o KERS, um tipo de booster que jamais existiu na F1. Outra variação que não havia no passado quando a potência poderia cair por conta do desgaste.

Está muito certo Vettel quando diz que os pilôtos devem passar a maior parte do tempo olhando no cenário da corrida e a botoeira de hoje dificulta isso. E para piorar mais, os carros de hoje são bem mais velozes em curva. Ou seja, o tempo de decisão diminuiu mas as tarefas aumentaram. No fundo acho uma incoerencia pois está arriscando o limite de raciocinio do ser humano num cenário onde o tempo para agir dimiui sempre. Até que algum dia alguem não consiga.

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